Antes visto como vilão, o alimento ganhou versões saudáveis e saborosas, graças ao aumento da quantidade de cacau em sua composição. Para assinalar o Dia Mundial do Chocolate, 7 de julho, a Revista do São Carlos Clube procurou o nutricionista Daniel Andrade, que nos falou um pouco sobre esse produto tão apreciado por pessoas de todas as idades, no mundo todo. Confira a entrevista na íntegra:


 

É verdade que consumir chocolate traz felicidade? Que hormônios ele libera em nosso cérebro para promover o bem-estar?

Sim, isso é verdade! O chocolate possui um aminoácido chamado triptofano, responsável pela produção da serotonina, neurotransmissor que nos proporciona a sensação de bem-estar. Além disso, o chocolate possui uma combinação de certos tipos de gorduras e açúcares que estimulam a produção de outro neurotransmissor responsável pelas nossas sensações de prazer e excitação (dopamina), e o consumo de chocolate também reduz o hormônio do stress, o cortisol.

 

Qual o melhor tipo de chocolate para consumo?

O melhor tipo é aquele que contém maior quantidade de cacau se comparada com a de outros nutrientes (açúcares, gorduras e aditivos alimentares). Quanto maior a quantidade de cacau, maior a quantidade de compostos antioxidantes – substâncias que favorecem o bom funcionamento do organismo. O produto que apresenta uma boa quantidade de cacau é o chocolate amargo e aqueles com mais de 50% de cacau. Porém, vale a pena ressaltar que a verdadeira nutrição não é baseada em apenas nutrientes, antioxidantes e polifenóis – o ato de nutrir envolve padrões comportamentais, sociais, culturais e econômicos. Dessa forma, podemos dizer que o melhor chocolate é aquele do qual você gosta, aquele que você tem condições de comprar e, acima de tudo, aquele que não te faz sentir culpa quando come. Pois não adianta nada você consumir descontroladamente um chocolate munido de alta qualidade nutricional. Comportamento alimentar é tão importante quanto nutrientes. 

 

Podemos consumir chocolate diariamente? Qual a quantidade ou a frequência ideal?

Ao contrário do que muitos pensam, SIM, podemos consumir chocolate diariamente. O que diferencia o remédio do veneno é a dose, portanto, se o consumo diário for consciente e moderado, não existe problema em comer um pouquinho de chocolate por dia. Segundo estudos mais recentes, a quantidade diária adequada varia entre 25 e 30 gramas.

 

O chocolate 70% é melhor do que o ao leite? 

Todo chocolate, assim como todo alimento, quando consumido de forma descontrolada, traz malefícios para a saúde. Não existe alimento “milagroso” nem alimento “venenoso”, tudo depende da quantidade consumida. Dessa forma, é melhor consumir um chocolate com menor qualidade nutricional, mas em quantidades adequadas, do que um chocolate cheio de frescuras em grandes quantidades. 

 

Chocolate pode fazer mal? 

Como qualquer alimento, o chocolate, quando consumido de forma inadequada, pode trazer malefícios, que incluem sobrepeso, obesidade, diabetes tipo 2, problemas gastrointestinais, enxaqueca, aumento do colesterol e triglicérides, redução da tolerância à glicose, dentre outros.Tudo isso devido à elevada quantidade de açúcares e certos tipos de gorduras (saturadas e trans) que alguns chocolates possuem, além do fato de alguns conterem quantidades exorbitantes de aditivos alimentares.  

 

A partir de que idade as crianças podem consumir chocolate?

Quanto mais tarde as crianças tiverem contato com o chocolate, e também com doces de forma geral, melhor! Antes dos 2 anos, não existe necessidade de a criança ter contato com alimentos hiperpalatáveis. A criança aprende, desde muito cedo, o significado emocional, social e cultural dos alimentos, desenvolvendo, desse modo, predileções e rejeições. A criança vai construindo seu próprio padrão de comportamento alimentar, que é estimulado diretamente pela exposição repetida aos alimentos que lhe são oferecidos. 

O chocolate e doces em geral promovem a liberação de certos neurotransmissores que aumentam a nossa sensação de prazer e felicidade, fora a alta densidade calórica, então, se o ambiente onde a criança vive permitir o consumo desse tipo de alimentos desde o nascimento ou então desde muito cedo, muito provavelmente a criança terá maior predileção por esses alimentos hiperpalatáveis. Essa condição desfavorável pode levar a distúrbios alimentares que podem permanecer ao longo da vida, facilitando a promoção de inúmeras doenças crônicas, como obesidade, diabetes, hipertensão, síndrome metabólica, compulsões alimentares, dentre outras.

O ambiente onde a criança vive influencia seu desenvolvimento, seu crescimento, seu comportamento e, inclusive, suas escolhas alimentares. Portanto, podemos dizer que a genética é estimulada pelo ambiente. Cabe aos pais terem bom senso e não proporcionarem um ambiente facilitador da instalação da obesidade e de outras doenças crônicas.

 

É verdade que o chocolate atrapalha a absorção de vitamina C?

Ele pode influenciar a absorção da vitamina C pelo fato de conter uma certa quantidade de cafeína.

 

O consumo de chocolate pré-treino ajuda no desempenho?

O consumo em horários que antecedem o treino pode, sim, favorecer o aumento da performance pelo mecanismo de ação no sistema vascular. Os efeitos mais nobres do chocolate estão relacionados ao seu teor de flavonoides, substâncias encontradas em abundância em alguns vegetais, que promovem o bom funcionamento dos vasos sanguíneos.

O cacau também apresenta uma concentração significativa do subtipo flavanol (epicatequina, catequina, e procianidinas), apontado como o componente que mais tem efeito na saúde vascular. Porém, seu consumo deve ser estipulado de forma individualizada pelo profissional de Nutrição, pois, se consumido em excesso antes do treinamento, pode ocasionar problemas laxativos.

 

Chocolate dá espinhas?

Ele pode gerar quadros de inflamação cutânea e aumento da produção de sebo devido à presença de alguns tipos de gorduras e açúcares e também pelo seu índice glicêmico elevado.

 

E pode ser afrodisíaco?

Sim, o chocolate pode ser afrodisíaco, porque seu consumo libera substâncias químicas responsáveis pela nossa sensação de prazer, desejo, excitação e felicidade.

 

É verdade que alguns alimentos ajudam a reduzir a vontade de comer chocolates/doces, como, por exemplo, a lentilha? Se sim, quais outros alimentos têm essa característica?

(risos) Infelizmente NÃO é verdade! A única forma de matar a vontade de comer doces é comendo doces! Comer doces não é pecado, e não é somente esse grupo de alimentos que é responsável pela obesidade e sobrepeso. A obesidade é causada por inúmeros fatores, e o excesso de consumo de alimentos hiperpalatáveis pode contribuir para o aumento da prevalência da doença. Mas culpar somente o açúcar e os doces em geral não é bacana. A regra é não fazer das exceções uma regra! 

 

Que estratégia alimentar você indica para reduzir a vontade de comer chocolate?

A estratégia que gosto de trabalhar com meus pacientes é fazê-los entender que o segundo, o terceiro e os outros pedaços sempre terão o mesmo gosto do primeiro, e que é mais adequado comer um pouquinho de chocolate por dia do que uma barra de uma vez. Fora isso, também gosto de estimular o comportamento alimentar pedindo para que atentem ao comer emocional e ao comer fisiológico, explicando a diferença entre fome e apetite.

 

Daniel Andrade

Nutricionista Clínico – Esportivo & Comportamental 

CRN/3 – 63.827